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E eles vão levando

8 de junho de 2010

Escrito em novembro/2006.
A notícia é velha, a história é pra sempre. 

 

 

Estreou neste sábado, 19 de novembro, na Academia Music Hall de Brasília, a turnê do novo disco de Caetano Veloso, “Cê”. Lançado em setembro deste ano, o álbum tomou todas as páginas e publicações de crítica musical – não necessariamente como o grande lançamento do ano, mas suficientemente elogiado.

O cantor e compositor baiano está hoje com 64 anos, e “Cê” se torna seu primeiro disco de canções inéditas dos últimos seis anos, desde “Noites do Norte”, de 2000.

Neste período, Caetano investiu em regravações – como o controverso “A Foreign Sound” (2004), álbum em que deu sua versão a músicas inglesas e americanas – e em parcerias, como a dupla com Jorge Mautner (2002). Além disso, na última década, foi mesmo com as regravações que Caetano conseguiu se manter no circuito comercial, como as baladas românticas “Sozinho” (1999) e “Você Não me Ensinou a te Esquecer” (2003), que o dispararam nas paradas pops de sucesso e em nada lembravam o Caetano rebelde e experimentalista dos anos 60 e 70.

“Cê” não só é a sua primeira obra inédita no século 21, como também consegue resgatar um pouco de suas letras caleidoscópicas das primeiras décadas – claro que na medida do possível do que separa um jovem de vinte anos de um sexagenário.

Filosofias sobre o tempo, uma leve perversão e versos como “feliz e mau como um pau duro” ou “mucosa roxa, peito cor de rola” marcam tanto as faixas do álbum quanto o clima que se criou para o show.

“Cê” chegou às prateleiras (e aos sites de download) do Brasil no mesmo mês em que, no Tom Brasil Nações Unidas, em São Paulo, Chico Buarque fazia a bateria de cinco semanas de show – prolongadas para sete – do álbum que havia lançado em maio, “Carioca”.

Como Caetano, Chico estava devendo novidades aos fãs desde o século passado. Em seu caso, a reclusão foi ainda maior: o último álbum de inéditas havia sido “As Cidades”, de 1998, quando foi também a última vez que subiu ao palco. Depois disso, voltou esporadicamente à mídia com trabalhos alternativos à música, como a peça “Cambaio” (2001) ou o livro “Budapeste” (2004).

É curioso observar a volta quase simultânea de dois ícones da cultura brasileira que, digamos, mesmo que separados sempre andaram juntos.

Caetano foi a cabeça da leva baiana que invadiu o sudeste com a bagunça ideológica da Tropicália nos anos 60. Chico era o carioca de família intelectual que se lançou com a imagem do bom moço de “A Banda” para virar o alvo preferido dos censores nos anos 70.

Cada um veio e seguiu por um caminho próprio. Compuseram apenas uma canção em parceria – “Vai Levando” (1975) –, dividiram os bastidores dos festivais de música da década de 60, fizeram um show juntos em 1972 (ao fim dos respectivos exílios) e, em 86, apresentavam juntos um programa de música mensal na Rede Globo.

Chico é dois anos mais novo que o colega. Nasceu em 1944 e completou 62 em junho. Lançou seus dois primeiros álbuns em 1966 (inclusive a trilha sonora de “Morte e Vida Severina”, peça de João Cabral de Melo Neto) e, no mesmo ano, arrebatou o público e os jurados do II Festival da Música Popular Brasileira da TV Record com seu “… pra ver a banda passar, cantando coisas de amor”, que levou o primeiro lugar.

Em 1967 foi a vez de Caetano, que lançou seu álbum de estréia, “Domingo” – uma parceria com a então também iniciante Gal Costa –, e no Festival da TV Record do mesmo ano caiu nas paixões do povo com “Alegria, Alegria”. Sua canção ficou em segundo lugar, atrás dos vencedores Edu Lobo e Capinam, por “Ponteio”, e à frente de – vejam só – “Roda Viva”, de Chico Buarque.

Em 1968, Caetano lançava seu primeiro disco solo, criava a Tropicália, inseria guitarras na MPB e colhia vaias e aplausos à sua atitude irreverente. Já Chico difundia a nova fama de rebelde com “Roda Viva”, peça e música, e pronto: estava feito um ídolo de talento ratificado ao gosto dos militantes da esquerda em busca de alternativas de reação à ditadura militar.

Após o decreto do AI-5, em 13 de dezembro de 1968, os dois artistas – como aconteceu com muitos – acabaram exilados, voltando ao Brasil apenas no início da década seguinte. Chico então se consolidou com suas refinadas canções de protesto. Caetano trouxe consigo uma melancolia londrina em que diluiu – mas manteve – o (des)comportamento dos rápidos dois anos de Tropicália.

Os dois artistas apareceram e se tornaram referência juntos. “Cê” é o 40o disco dos 39 anos de carreira de Caetano. “Carioca” foi o 41o dos 40 da de Chico.

Com este lançamento, o baiano finalmente fez as pazes com a crítica e com os seus fãs mais tradicionais, que reprovaram sua fase comercial do fim dos anos 90 e começo dos 00. Chico e seu novo disco estão bem longe do cancioneiro de protesto dos anos 70 que alguns fãs ainda acham que ele é, mas isso não impediu que a sua turnê fosse um fenômeno. O primeiro dia de bilheteria – um mês e meio antes do primeiro show – rendeu uma fila de mais de duas horas com pessoas de todas as idades, desde contemporâneos do ídolo até meninas vinte anos mais novas do que as canções que admiram. Em quatro semanas, os 41 mil ingressos postos à venda já estavam esgotados.

A longevidade de duas carreiras concomitantes e a volta simultânea depois de uma pausa de período semelhante podem ser apenar coincidêncica. Mas a afinação é perfeita.

6 Comentários leave one →
  1. Rafael Truffaut permalink
    14 de junho de 2010 16:03

    duas horas, não. QUATRO HORAS de fila foi o que eu enfrentei para ver o Chico passar.

  2. Juliana Elias permalink*
    25 de junho de 2010 20:20

    Eu era umas das primeiras, mas fiquei umas duas horas esperando.. Um monte de velhinha e grávida entrando na frente!

  3. 23 de julho de 2010 01:25

    Vamos combinar que está desatualizado, né?! rs

    • Juliana Elias permalink*
      23 de julho de 2010 14:27

      está marcelo. conforme eu avisei no intertitulo, no alto da página. 😛

  4. 2 de agosto de 2010 18:10

    Muito legal seu blog, viu? Abs!

  5. 2 de novembro de 2010 16:52

    Caí aqui por causa dos comentários xenófobos do pessoal no twitter, o que me leva a crer que tudo realmente pode ter um lado bom.

    Muito bom blog, parabéns.

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